Desvendando o mundo da literatura fantástica com o escritor Adriano Messias

by - terça-feira, agosto 30, 2011


O escritor Adriano Messias é um profundo conhecedor do desconhecido. Ao longo dos anos, e das publicações, essa tem sido uma de suas especialidades: contar histórias mal-assombradas, que desobedecem a ordem natural das coisas e surpreende o leitor. 






Autor de uma série de livros infanto-juvenis, foi na coleção Contos Para Não Dormir que Messias fez desse desconhecido e do quase impossível os protagonistas de suas histórias.
E para falar um pouco desse gênero literário, o escritor bateu um papo com o SaraivaConteúdo. De primeiríssima mão, a Cachola Literária compartilha essa entrevista com você.Confira!



Quando você começou a escrever histórias com esse viés fantástico? Aliás, agora, o fantástico é a nova febre.

Adriano Messias. Sempre gostei da literatura fantástica e eu escrevo desde menino sobre temas fantásticos. Veja: o grande Borges disse que a literatura nasceu fantástica e continuava fantástica, e deu a entender que o realismo literário era uma espécie de “hiato” engendrado pelo século 19. Mas muitos tiveram a percepção inversa – devido, em parte, aos cânones que sempre imperaram nas letras – de que o fantástico seria algo secundário ou menor para a literatura, uma espécie de tentativa escapista e imaginosa, gratuita até. Entretanto, é justamente o contrário: o mundo tem muito de fantástico (e que bom isso!). Ele nos ajuda a entender o mundo, a dar sentido às coisas.

Há algum marco que tenha impulsionado esse gênero no país?

Adriano Messias. O que me encanta na época em que vivemos é que as mídias e as artes se convergem. O cinema se influencia pela literatura, e vice-versa, por exemplo – talvez mais do que em outros momentos. De vez em quando, começa uma nova “onda” e surgem profusões de best-sellers, blockbusters, novelas e seriados sobre um determinado tema, e, em um curto espaço de tempo, essa temática se torna recorrente e transbordante. Multiplicam-se livros, filmes – com os mais diversos estilos e padrões de qualidade.

Foi o caso da onda de filmes, livros e séries sobre vampiros?

Adriano Messias. É o que aconteceu com os vampiros, recentemente. Agora os dentuços deram uma acalmada para, em outro momento, voltarem com mais força (é da índole dos monstros sempre retornarem). Devido a isso, fica difícil mencionar um “marco”. Eu acredito no movimento próprio da cultura e na produção de sentidos. É isso que propicia ondas, marolas e vagalhões na literatura fantástica.

Quais seriam os ingredientes fundamentais para esse tipo de história?


Adriano Messias. Existem bons estudos sobre o fantástico na literatura. No cinema, tais estudos têm uma história mais. Existem compêndios sérios que vão dizer o que faz um enredo ser fantástico, por exemplo. Acredito, entretanto, que um evento que irrompa a ordem esperada das coisas seja uma das principais marcas de uma história fantástica.

Fala-se muito em imaginação e fantasia quando se fala de literatura fantástica. Mas esses elementos estão presentes em qualquer gênero literário, certo?
Adriano Messias. A imaginação e a fantasia que, informalmente, acabam sendo quase sinônimas, são também ferramentas para se produzir uma obra. Porém, não é só isso. Acho que você tocou em um ponto delicado: no caso de um livro, não basta um escritor ter uma torrente de boas ideias se o texto não as acompanha. Se, por um lado, a gente brinca ao dizer que “não há mais o que inventar”, por outro, temos a obrigação de entendermos o que fazemos.

O Brasil tem muitos escritores do gênero?

Adriano Messias. Em termos históricos, poderia ter tido mais, ou, pelo menos, ter “valorizado” mais. Acontece que, em nossa tradição, sempre se valorizou a literatura chamada de “realista”, ou mais voltada para uma imitação ou reprodução da vida social e de seus problemas. Eu chamo atenção é para o fato de que, em vários momentos de nossa produção literária, ter-se desprezado um contexto mais fantasioso ou fabuloso em detrimento do recorte realista e naturalista. Falava-se, no máximo, a partir da segunda metade do século passado, em “realismo mágico” – ainda com grande modéstia. Um preconceito, claro, pois a literatura fantástica sempre foi considerada uma literatura “menos séria”.

Há alguma exceção?

Adriano Messia. Um campo que a recebeu de braços abertos foi o da literatura infantojuvenil, onde os autores se sentem bastante confortáveis para escrever sobre temas fantásticos. Porém, para muitos estudiosos e críticos, sempre pareceu que a literatura fantástica cabia mais à “imaginação infantil” e aos “devaneios dos sonhadores”, o que não é verdade. Afinal, o fantástico é composto pelas dobras fecundas do desejo humano e por tudo o que ele produz.

Quem são seus autores preferidos nesse estilo?

Adriano Messias. Como todo escritor amante do fantástico, li bons autores do século 19 e embrenhei-me na chamada – e tão pouco compreendida – “literatura gótica”. Porém, junto aos clássicos, sempre li de tudo sem preconceitos, passando pelos best-sellers à Stephen King, pela geração dos anos de 1980 – tanto estrangeira quanto brasileira -, e por livros imensamente devedores do cinema - um grande abastecedor do fantástico.

Quais os escritores do gênero que foram marcantes para você?

Adriano Messias. Dentre os “clássicos”, gosto de Coleridge, Byron, Polidori, Bram Stoker, Edgar Allan Poe, H. G. Wells, Théophile Gautier, Anatole France, Guy de Maupassant, Prosper Mérimée, Charles Baudelaire, Robert Louis Stevenson, Rudyard Kipling, Conan Doyle, Henry James, William Jacobs, E. T. A. Hoffmann, Borges, Kafka... Entretanto, é importante não apenas ler os autores fantásticos, mas também estudar sobre aquilo que se escreve, uma vez que, para ser um escritor, não existem “dicas”, “regras”, “receitas”, ao contrário do que tenho visto por aí. A escrita é também um ofício, uma profissão e, como tal, merece empenho, esforço, entendimento. O escritor tem de dominar os signos que lhe dizem respeito.

Foi difícil chegar até uma editora e publicar seu primeiro livro?

Adriano Messias. Dificílimo. Ainda não conheço quem tenha dito ter sido fácil, afinal, muita gente tem um original na gaveta, aliás, no arquivo do computador e, em meio a um mercado editorial tão competitivo e exigente, é um desafio se tornar um escritor. Convencer um editor de que seu material é bom e entender “as curvas e retas” do caminho é algo que vai requerer laboriosa paciência e gentil insistência. Hoje, com os recursos técnicos que temos, é bem fácil publicar. Difícil, porém, é ser publicado. Sempre foi, e acredito que sempre será.

Já está pensando em algum tema para explorar no próximo trabalho?


Adriano Messias. Eu sempre escrevo vários livros ao mesmo tempo. Tenho um processo de escrita que envolve papeizinhos, anotações esparsas, parágrafos que me vêm soltos pela madrugada e, aos poucos, tudo vai tomando forma. Estou sempre rodeado pelos temas do fantástico - seja para adultos ou crianças. E o resultado tem sido muito bom. Este ano já saíram - e ainda sairão mais alguns - livros meus para crianças e adolescentes. Tenho visitado escolas e eventos literários, e podido falar para as pessoas sobre meu trabalho e também ouvir sobre como elas se relacionam com os livros e com a literatura. O retorno de meus leitores me dá muita satisfação.


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