Thalita Rebouças: ‘Corram atrás dos leitores’
O mantra de que poucos leitores brasileiros estão interessados na ficção escrita hoje no país, entoado por escritores e críticos, só se sustenta por meio do artifício de excluir do campo da ficção nacional o maior fenômeno de popularidade do século 21.
Sim, faz tempo que nossas listas de best-sellers viraram terra estrangeira, mas dificilmente alguma estrela internacional arrastará tanta gente à Bienal do Livro do Rio, que ocupa até dia 11 o Riocentro, quanto a escritora carioca Thalita Rebouças. Aos 36 anos, Thalita atingiu este ano a marca de 1 milhão de exemplares vendidos ao longo de dez anos de carreira, uma montanha de livros erguida com onze títulos voltados para um público-alvo muito preciso: adolescentes e pré-adolescentes do sexo feminino. “Para mim leitor é leitor, pode ter 8, 13, 20, 30 ou 60 anos”, diz ela.
Numa divertida entrevista deste ano a Jô Soares, Thalita lembrou a Bienal de 2001, quando subiu numa cadeira para apregoar aos passantes perplexos as qualidades de seu primeiro livro, “Traição entre amigas”. Em artigo publicado ontem no blog da Companhia das Letras, o editor Luiz Schwarcz poderia estar falando dela quando diz: “Se hoje sabemos que não é correto julgar as pessoas pela classe social, falta ainda aprender a não usar a literatura como forma disfarçada de preconceito. Falta aceitar e entender leituras e leitores diferentes de nós”. Isso mesmo: aceitar, entender e, acrescento eu, quem sabe aprender alguma coisa.
1. Escritores brasileiros costumam se queixar da falta de leitores. A culpa é dos leitores ou deles? Vendo você falar ao Jô da sua cara de pau na primeira Bienal de que participou, fiquei pensando: será que a nossa literatura não sabe se comunicar com o público? Que dicas você daria para mudar isso?
– A verdade é que o Brasil, comparado a outros países, ainda lê muito pouco. Eu acho que a minha cara de pau ajudou muito na divulgação, mas se os adolescentes não se identificassem com o meu texto certamente o mico da Bienal e as inúmeras visitas que fiz a livrarias não teriam valido a pena. De qualquer forma, para os pouco tímidos, minha dica é mesmo correr atrás dos leitores, principalmente nas feiras de livro. Deu muito certo para mim e está dando certo para outros autores que eu conheço. A competição é grande, é preciso arranjar uma forma de fazer a diferença.
2. Alguns críticos olham para grandes vendedores de livros infantojuvenis como você e enxergam apenas formadores de futuros leitores. É como se os leitores só se tornassem leitores ao chegar à chamada literatura “séria”. Isso traduz um preconceito, é claro, mas você tem notícia de fãs seus que partiram para novos desafios de leitura, chegando, sei lá, a “Grande sertão: veredas”?
– Para mim, leitor é leitor, pode ter 8, 13, 20, 30 ou 60 anos. Uma frase que eu escuto muito dos adolescentes é: “eu odiava ler e passei a gostar depois dos seus livros”. Muitas mães também me dizem, felizes da vida, que depois de um livro meu o filho não parou mais, que chega a pedir livros de presente de aniversário, olha que bacana. Fico toda prosa.
Os pré-adolescentes e adolescentes costumam implicar com livros. A transição do livro ilustrado para o livro só de texto é difícil, e muitos abandonam o hábito da leitura exatamente nesse período. Acho que cabe, sim, aos autores infantojuvenis trazer esses jovens de volta ao hábito da leitura. Mas não me vejo apenas como uma formadora de leitores, o que quero mesmo é mostrar para os adolescentes que ler não é chato, que pode trazer prazer, gargalhadas, lágrimas…
Já recebi emails de leitoras que começaram a ler meus livros na adolescência, estão agora na faculdade e seguem lendo de tudo. Claro que bate um orgulho e uma sensação de dever cumprido. Afinal, formar leitores é contribuir para um futuro melhor pra eles e para o nosso país. Se depois que me largarem eles descobrirem as delícias de ler Sabino, Saramago ou Guimarães Rosa, parabéns para eles.
3. Não que eu pense nisso como um caminho natural, mas quem sabe pode ser uma inquietação: você pensa em escrever romances adultos um dia? Se pensa, tem um tema na cabeça? De que gênero seria?
– Não penso em escrever para adultos. Uma vez ouvi a Ruth Rocha dizer que se não for pra criança, pra ela não faz sentido escrever. Pra mim é mais ou menos por aí. Eu gosto muito de fazer companhia para os adolescentes, é uma fase cheia de questionamentos, espinhas e amores platônicos, tudo é vivido com muita intensidade e sinceridade. Eu gosto da ideia de que, a partir de um livro meu, os jovens possam refletir e se entender melhor, entender melhor os pais, os professores, os amores…
Se um dia eu mudar de ideia e escrever para adultos vai ser em cima da linha que rege meu trabalho para os adolescentes: observação do cotidiano com humor. Ando fazendo isso no meu blog, que já andaram até apelidando de Thalita para Maiores. Mas muitos adultos acabam lendo os meus livros antes dos filhos e dizem que se divertiram, que se emocionaram, principalmente com os livros da série Fala Sério. Segundo eles, por serem formados por crônicas, esses livros são para todas as idades. Se os leitores dizem isso, não sou eu que vou duvidar.
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